O médium João de Deus, preso suspeito de abusos sexuais durante tratamentos espirituais em Abadiânia, passou a primeira noite no Núcleo de Custódia, no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia, na Região Metropolitana da capital. O líder religioso dormiu em uma cela de 16 m². Ele teve a prisão decretada a pedido da Polícia Civil e do Ministério Público Estadual de Goiás (MP-GO).

De acordo com a assessoria de imprensa da Diretoria-Geral de Adminsitração Penitenciária (DGAP), João de Deus está recebendo todos os seus medicamentos de uso contínuo.

João de Deus se entregou à polícia no domingo (16), às 16h20, em uma estrada de terra em Abadiânia. Ele foi levado para a Delegacia Estadual de Investigações Criminais (Deic), em Goiânia, e chegou por volta das 18h. O médium prestou depoimento até por volta de 22h, foi encaminhado ao Instituto Médico Legal (IML) para exame de corpo de delito e, em seguida, ao Complexo Prisional, onde está preso.

Ainda na Deic, o médium prestou depoimento por 3h. De acordo com o delegado-geral, André Fernandes, ele apresentou versões e explicações para as denúncias das mulheres que dizem que foram abusadas sexualmente por ele durante atendimentos espirituais. A defesa afirma que tem “sérias dúvidas sobre os depoimentos” das vítimas.

O delegado-geral não detalhou o conteúdo do interrogatório do médium. “Trata-se de informação sensível, é um caso delicado. Mas ele apresentou versões, explicações para os casos”, disse.

Fernandes explicou ainda que o interrogatório se limitou apenas às denúncias de abuso. “Vamos confrontar o que ele falou com as provas que temos e com os depoimentos colhidos e analisar tudo. Devemos ouvir ele uma segunda vez, mas primeiro precisamos fazer esses comparativos”, explicou.

Ao todo, 15 mulheres foram ouvidas pela Polícia Civil. Porém, agora, com a prisão do médium, a corporação acredita que mais vítimas devem surgir. Por fim, o delegado explicou que deve se encontrar com o Ministério Público, que já recebeu mais de 300 denúncias, para compartilhar informações.
O que diz a defesa
O advogado Alberto Toron, que defende o médium, disse que tem “sérias dúvidas sobre os depoimentos incriminatórios”. “Tivemos acesso a parte dos depoimentos e sem fotos das vítimas, então alguns casos ele não se lembra. E tem relatos de mulheres que dizem ter sido abusadas e voltaram lá outras vezes. Então, é preciso escrutinar tudo com calma para que não haja um linchamento”, explicou.

O defensor disse ainda que o médium alega inocência e que acredita que isso é uma armação contra ele. “O senhor João acha que tem gente que o quer destruir”, completou.

Toron informou que deve entrar com um pedido de habeas corpus nesta segunda-feira (17), também pedindo, se necessário, que seja concedida a prisão domiciliar do médium.

Sobre a movimentação de R$ 35 milhões nas contas de João de Deus, o advogado explicou que não houve nenhum saque. “Não houve nenhuma movimentação. Ele simplesmente baixou as suas aplicações para fazer frente às necessidades dele. O que se reputou que seria dinheiro para ele poder fugir cai por terra quando ele se apresenta. Ele se apresentou dando mostras claras de que respeita a Justiça e o Poder Judiciário e por isso está à disposição”, explicou.
Última visita à Casa
Na manhã de quarta-feira (12), o médium compareceu à Casa Dom Inácio de Loyola, onde realizava os trabalhos espirituais, pela primeira vez desde que as denúncias vieram à tona. Durante os poucos minutos que ficou no local, ele disse que era inocente e que confiava na Justiça de Deus e dos homens.

“Meus queridos irmãos e minhas queridas irmãs, agradeço a Deus por estar aqui. Ainda sou irmão de Deus, mas quero cumprir a lei brasileira porque estou na mão da lei brasileira. João de Deus ainda está vivo. A paz de Deus esteja convosco”, diz João de Deus.

A assessora de imprensa do religioso, Edna Gomes, afirmou, após as declarações, que o médium era inocente, mas que as denúncias eram graves e deveriam ser apuradas.
Denúncias
O jornal “O Globo”, a TV Globo e o G1 têm publicado nos últimos dias relatos de dezenas de mulheres que se sentiram abusadas sexualmente pelo médium. Não se trata de questionar os métodos de cura de João de Deus ou a fé de milhares de pessoas que o procuram.

A força-tarefa que investiga as denúncias contra João de Deus começou o trabalho de investigação do dia 10 de dezembro, depois que o programa Conversa com Bial divulgou o relato de 10 mulheres que disseram ter sido abusadas sexualmente pelo médium.

O Ministério Público Estadual de Goiás (MP-GO), que assim como a Polícia Civil, investiga a suspeita de crimes sexuais durante tratamentos feitos pelo religioso, havia contabilizado, até este domingo (16), mais de 300 denúncias contra o médium.

Para atender às mulheres que não moram em Goiás, o MP-GO preparou uma sala de videoconferência. Nela, ficam os cinco promotores de Goiás que participam da força-tarefa, duas psicólogas e dois tradutores de línguas estrangeiras.

“Temos casos fora do Brasil, por isso, temos a necessidade de acompanhamento para ajudar a gente a esclarecer todas essas situações”, afirma o procurador-geral do órgão, Benedito Torres.